sábado, 7 de julho de 2007

JORNAL DE MONTES CLAROS - 16 e 17-05-1987

Rui Muniz continua incomunicável e TJ julga habeas corpus 2ª feira
BELO HORIZONTE- Está na Justiça o caso do golpe de Cz$34,9 milhões aplicado na agência do Banco do Brasil na Savassi, na capital mineira, no dia quatro de maio corrente. Foram entregues no Fórum, no final da tarde de ontem, os autos dos flagrantes de Rui Adriano Borges Muniz (27 anos, médico, professor, suplente de deputado pelo PT e proprietário do Colégio Indyu, em Montes Claros); Manoel Pedro Gonçalves Francisco (27 anos, engenheiro e comerciante, com domicílio em Belo Horizonte e Janaúba); e Setembrino Lopes Filho (26 anos, engenheiro, caixa do Banco do Brasil em Belo Horizonte, filho do vice-prefeito de Capitão Enéas). Rui Muniz, que vinha sendo defendido por advogado ligado ao PDT de Montes Claros, (partido ao qual está filiado), contratou na capital o advogado Marcos Afonso de Souza, que vai pedir ao Tribunal de Justiça, na próxima semana, a soltura dos três estelionatários, alegando que nenhum deles poderia ser preso em flagrante. O advogado informou que os três golpistas permanecem presos no Dope, impedidos de receber visitas. Na quinta-feira, dia14, quatro advogados impetraram para Rui Muniz um primeiro habeas-corpus, que está sendo julgado pelo juiz Joaquim Lima Gomes Filho. O caso foi destacado em primeira página por todos os grandes jornais, ontem, O Estado de São Paulo destaca o fato de Rui Muniz ser suplente de deputado pelo PT. O Globo esclarece que Rui Muniz já deixou esse partido e está filiado ao PDT. O esclarecimento do golpe contra o Banco do Brasil ocupou grande espaço no órgão oficial do Estado. O “Minas Gerais”, que foi criado a 6/11/1891 e somente agora publicou em sua primeira página uma notícia policial.


O BELO O GOLPE


Segundo o secretário de Segurança Pública, Sidney Safe da Silveira, o golpe começou quando Setembrino Lopes Filho conseguiu a chave secreta para liberação de ordem de pagamento da Prefeitura de Janaúba, no Banco do Brasil, número que varia diariamente. A quadrilha alugou, então, um telex e, através dele, remeteu, no dia quatro de maio, ordem de pagamento usando o indicativo do Banco do Brasil de Janaúba para a agência da Savassi, em Belo Horizonte, para que fosse liberado o dinheiro para Luiz Roberto de Souza Marques; nome falso com o qual Rui Muniz abriu conta em agência do Banco Real, na capital. Quando a ordem chegou, o médico foi ao banco da Savassi, com a identidade falsa, e de lá mesmo liberou “DOC” para sua conta no Banco Real. Posteriormente, os membros da quadrilha dividiram o dinheiro em várias parcelas que foram aplicadas em diversos bancos de investimentos. Eles receberam desses bancos cheques endossados com os quais começaram a comprar dólares ao que seria a terceira fase da “lavagem” do dinheiro, após o que seria impossível localizar os criminosos. O desfalque foi descoberto na segunda-feira, dia 11, quando a agência de Janaúba informou que a ordem de pagamento não correspondia. Inspetores do BB e agentes da Secretaria de Segurança saíram a campo, investigando o caso. Num “golpe de sorte”, segundo Sidney Safe, na terça-feira o gerente do banco Bozano Simonsen suspeitou de Setembrino Lopes Filho, que procurava doleiros, para comprar grande soma em dólares. Preso, ele confessou o crime e entregou à Polícia Civil 216 mil dólares. No mesmo dia, Manoel Pedro foi preso quando tentava aplicar Cz$ 4,2 milhões no Banco Mercantil de Crédito. Denunciado pelos seus comparsas, Rui Muniz foi preso em Montes Claros, na quarta-feira, às nove da manhã quando saia de sua casa, na rua Januária. Ele negou qualquer participação no golpe, mostrando grande frieza até às 20h30min, quando chegou ordem da Secretaria de Segurança Pública para levá-lo para Belo Horizonte, em avião que estava chegando a Montes Claros. Rui Muniz reagiu, tendo de ser algemado. Segundo a polícia, ele tentou atrasar a o máximo a viagem até o aeroporto, tentando abrir a porta do carro e desviando a atenção do motorista (detetive José Messias). O avião levantou vôo as 21h 01min, portanto um minuto após o horário permitido, um delegado teve que assinar um termo de responsabilidade). Segundo a polícia, a intenção do médico era ficar em Montes Claros aquela noite, pois acreditava que o Luiza Eulina do Carmo Almeida poderia deferir habeas-corpus impetrado a seu favor, o que não aconteceu. Todo o dinheiro já foi recuperado e devolvido ao Banco do Brasil, mas a Polícia apura se os estelionatários não desviaram rendimentos das aplicações que fizeram. Rui Muniz teria aplicado Cz$400 mil no mercado de Montes Claros. Ele foi trazido à cidade no dia seguinte para mostrar onde havia escondido o dinheiro, que a Polícia levou de volta.


Interrogado pelo juiz Páris Peixoto Pena, da 7ª Vara Criminal de Belo Horizonte, o estudante de Medicina e professor montes-clarense Ruy Adriano Borges Muniz confirmou seu envolvimento no golpe de Cz$ 39 milhões 450 mil aplicado contra o Banco do Brasil, no dia quatro de maio. Ele alegou que o fez porque teve “grandes gastos com a campanha política, ao tentar uma cadeira na Assembléia Legislativa pelo PT”. Disse Ter relutado, a princípio, em aceitar o convite do engenheiro Setembrino Lopes Filho, seu amigo “há mais de 20 anos” e funcionário do Banco do Brasil. Revelou que só decidiu participar quando Setembrino já tinha a chave-código em seu poder. Ruy Muniz afirmou que o dinheiro do golpe foi aplicado em várias instituições financeiras e na compra de dólares, num total de 601,2 mil em moeda americana. Ele acusou o delegado Sarmento e os detetives Regino e França de “tortura e seqüestro, pois invadiram minha casa, bem armados, colocaram-me num avião e durante toda a viagem, embora encapuzado, fui espancado pelos policiais”. Autor intelectual do golpe, o engenheiro Setembrino Lopes Filho, que é filho do vice-prefeito de Capitão Enéas, disse que o desfalque nasceu em abril, quando propôs ao amigo Ruy Muniz aplicá-lo juntos, argumentando, na época que “tinha acesso a todas as repartições”. Declarou que o Ruy resistiu a princípio ao convite para participar da fraude. Contou Setembrino Lopes que, no dia quatro de maio, já como todo o plano analisado por ele e Ruy Muniz, o colocaram em execução. Disse que conseguiu entrar na sala de telex e transmitir a mensagem de ordem de pagamento. Depois, trabalhou normalmente até às 17 horas. Afirmou o engenheiro que o seu depoimento prestado na polícia foi obtido “sob pressão”, denunciando o delegado Sarmento e quatro detetives de tê-lo torturado e de terem ameaçado as suas irmãs. Lembrou que na década de 70 um funcionário, conhecido por “Bom Burguês”, também aplicou golpe contra o BB, e o dinheiro foi usado por grupo guerrilheiro. Lembrou que no seu caso todo o dinheiro foi devolvido ao banco, que teve prejuízo. Assegurou estar arrependido e ressaltou ao juiz que “tive berço e sou de família tradicional”. Isento, por Ruy Muniz e Setembrino Lopes, de qualquer responsabilidade no golpe, o comerciante janaubense Manoel Pedro Gonçalves Francisco disse, ao ser interrogado, que desconhecia a origem do dinheiro. “Pedrão” confirmou que tentara descontar título de Cz$ 3,6 milhões, a pedido de Ruy e Setembrino. “mas não tinha a mínima idéia do que se tratava”. Ele defendeu-se da acusação de ser cúmplice na fraude, declarando que “só fui envolvido por ser amigo deles”, que foram por ele levados para gravarem fita de telex em uma empresa e que seria usada na fraude. A este respeito, o comerciante frisou. “Eles me disseram que a fita serviria para transmissão de mensagens políticas defendendo a criação do Estado de são Francisco”.

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